Ensaio de um Neurótico Melancólico



Os neuróticos e suas neuroses maquiadas, malcriadas, disfarçadas, algumas desequilibradas neuroses.

Ele não sabe se foi sincero, austero, ele disse: reverbero a minha infância e não sei o limite entre o falso, o profano, o sincero e o moicano, por isso prefiro me isolar.

E quem disse que quero viver, pois sou melancólico, ou quem sabe, maníaco obsessivo, pelo menos o nome é mais bonito. Depressivo como manhã de chuva, sem sol.

            Ainda bem que meus mecanismos de defesas funcionam. Só faço o que quero, e faço com consciência. Se feri alguém foi sem querer, para meu prazer, para meu deleite, sou suficiente, pleno, mas não sou mal, sou o tal. Não preciso me defender, sou clean e necessário ao mundo.

Não, não é verdade, sou inseguro, acho que tenho complexo de inferioridade. Por favor, não me leve a mal, não sou o tal. Ajude-me a mudar. O que será que eles pensam de mim?

Tenho, sou contraditório, conflito. Sou só, sou pedra de mó. Não sou compreendido, sou vítima de perseguição, sou solidão, isolado, sem afeto, sem sexo, sem nexo. Não tem sentido os valores, as cores, os amores, os horrores sinônimos de dessabores. Por não ser exato, preciso, nem quero ser, fico quieto, só. Relação virtual, digital é mais segura. O Mal do século é o conflito interno, a solidão sem solitude. Que se dane o resto.

Eu olho para você, te vejo arrogante, eu olho para ele, o vejo egoísta, eu, com olhos para eles, percebo-os alienados, encharcados de consumo, de prazeres como discípulos de Epicuro, imersos em uma panela de pressão, pressionando para amoldarem-se, conformarem-se, e ainda são arrogantes, legitimando valores voláteis. Eu olho para mim e recolho-me. Problema do planeta se não me percebem.

Problema meu que não atraio carinho, afeto, atenção, beijo, sexo. Sem química, sem vibração, sem eira nem beira. Preciso mudar o perfume e vestir roupa de marca, talvez. Quem sabe ouvir o pop da vez, voltar a assistir o Jornal das nove da noite.

Quem sabe passar a tomar Prozac, ficar feliz, ser agradável aos outros, ou comprar um carro na Promac, um zero quilometro de preferência. Ou pegar, simular uma doença, talvez seja o caminho mais rápido para chamar a atenção. A verdade é que hoje eu não estou nada bem, nada de menos que eu tome veneno, que morra comendo pão com bacalhau, nada conciso, todo lambido, meu corpo em putrefação.

Depressão e melancolia, acho que não é por aí, é coisa da minha cabeça, apesar do mal cheiro, vou ao futebol torcer pelo Treze que joga a Série C, da minha terra, da minha raça, da minha província. Vou ao Shopping, comer roupa, vestir cinema, sorrir ideias. Vou voltar a assistir o jornal. A tempestade me excita.

Não devia querer muito, não devia querer nada. Querer é sinônimo de sofrimento, de frustração, de desalento. Conquistar desperta inveja, rivais, mal olhado, figas, alhos e sal grosso. Preciso da moeda número um do Tio Patinhas.

Preciso superar o medo, medo do escuro, do fechado, da multidão, da derrota, de levar o fora, o não; medo do grito do tio, do espancamento do pai, da calunia, da difamação. Preciso me isolar. A compra da roupa de marca não preencheu, do carro novo, só foi bom, até o terceiro mês. Atraí pessoas piores que as pessoas, poucas loucas, quase ninguém que estavam perto.

Não nego, os três meses de euforia consumista, na pista, como lagartixa, balançando a cabeça, também tiveram seus dias bons. Ela batia em mim e me beijava, agredia e acalentava e gostava quando eu falava palavras obscenas, depreciativas. Ela gemia e xingava, quando beliscava a sua barriga; ela dizia que meu carro era lindo.

Não nego, apesar do pouco tempo de bom, foi bom. Meu irmão me ligou perguntando como eu ia pagar o bonito carro, deu parabéns irônico, sarcástico pelo carro, mas, foi parabéns. Meu pai com olhar assustado falou, que os amigos iriam perguntar como prosperei, ele precisava dar satisfação. Eu disse, com ar de humor: não, não ladrão, sou apensas falsário, estelionatário e o mundo é dos mais espertos.

Sem nexo, tudo, o vazio continua. Aproveitei o ensejo para falar com meu pai sobre a vida, ele ficou na defensiva, justificou-se e eu nem cobrei nada. O diálogo travou, fomos para uma das tangentes, falamos de música, de gente. O Fluminense perdeu para o Corinthians na semifinal de 76. Ele riu muito e eu chorei.

Passou, voltei as cinzas da mulher amiga, namorada sublimadora das melancolias com cinzas e sorrisos disfarçados de segurança. Morreu jovem carcomida por um câncer, contudo, antes a ajudei a descobrir o amor contraditório, mas sincero. Não era isso que queria expressar.

A realidade verdadeira, real, concreta vem à noite; o silêncio, a não luz mostra-me a realidade dos fatos. De fato não há esperança, pois não há sentido. Tenho medo do silêncio da noite, pois me escuto, não gosto de me ouvir. Quando não escuto-me, escuto outras vozes, que não são boas conselheiras, levam-me a saber quem são meus inimigos, quem me perseguem. Eles me perseguem pois sou ameaça, inconveniente para todos.

Aonde estão os verdadeiros amigos? Talvez no outro lado do planeta, no outro mundo, no além túmulo.

Minha mãe observa-me, meu pai uma ameaça, meus filhos não sabem como chegar a mim. Talvez, eu precise escovar os dentes, tomar banho, pentear os cabelos, quem sabe buscar ajuda em uma religião, em Deus, talvez em um psiquiatra.

Até outro momento espelho, espelho meu.

 

Pedro

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